(Ilust.Valéria do Campo) |
Criei um idioma para nós dois. Nele, os verbos não são de ação, são de estado. De ligação. Nesta língua
restrita a nós, as palavras são leves como plumas, se assentam onde querem,
como querem e rimam entre si sem pedir nossa ajuda. Tudo é sonoro e harmônico, com
musicalidade, ritmo e métrica. Ali, todos os adjetivos designam qualidades
positivas e o advérbio mais presente é o de intensidade. Um advérbio de dúvida só aparece para aforquilhar o que pode ser perfeito e o que pode dar
certo. A única preposição é a essencial: “entre”. E liga nós
dois elementos de uma oração (divina), nos subordinando sempre um ao outro. Ora
somos termos regentes, ora somos regidos.
Nesta minha linguagem também existe a comunicação não verbal onde os pensamentos se encontram e se
cumprimentam com abraços. Onde nossas impressões acerca das coisas deste mundo
se esbarram e se beijam todo tempo, nos traduzindo. Em minha língua há dois pronomes: nós. Nosso
substantivo é abstrato, impalpável como tudo que não se perde no mundo. O artigo é
indefinido, o numeral é multiplicativo e a
conjunção é aditiva, vem para somar. As interjeições? Ah, as interjeições! Não
há amor expresso sem elas... Não que eu conheça. As interjeições, limitei às
necessárias: de alegria, invocação, saudação, admiração, de aplauso, agradecimento, animação, de chamado, de desculpa, de desejo e claro, de saudade. Oh, saudade!